Panorama da geoquímica do estrôncio (Sr)

O elemento estrôncio possui quatro isótopos naturalmente ocorrentes: 84Sr, 86Sr, 87Sr, e 88Sr. Apenas o 87Sr é radiogênico – produzido pelo decaimento β de 87com meia-vida de 48,8 bilhões de anos. O isótopo mais abundante de estrôncio é o 88Sr, que compõe cerca de 83% do estrôncio naturalmente ocorrente, seguido por 10% de 86Sr, 7% de 87Sr e <1% de 84Sr. Em investigações geológicas e ambientais, a razão de 87Sr/86Sr é tipicamente usada por causa de suas abundâncias similares – 7% e 10%, respectivamente.  

Strontium isotopes

As quatro espécies isotópicas de estrôncio. A razão de 87Sr/86Sr é comumente usada em estudos geoquímicos

O estrôncio é um elemento-traço universal e está presente em rochas, solos, águas, plantas e animais. A razão de 87Sr/86Sr é uma função da origem geoquímica, concentração de Rb e da idade da rocha-mãe. Por causa da alta massa do Sr, a razão permanece essencialmente inalterada com a meteorização e movimento da rocha pelo ciclo da água e cadeia alimentar. Assim, a razão de 87Sr/86Sr é extensivamente usada em mapeamento geoquímico, determinação de fonte, previsão de contaminação, e estudos de migração e mobilidade. Uma mudança sistemática da razão de 87Sr/86Sr na água marinha ao longo do tempo deu base à estratigrafia do estrôncio e à cronologia do estrôncio de carbonatos biogênicos marinhos e fosfatos.

Amostras aceitas para a análise de estrôncio (87Sr/86Sr) analysis: ossos, foraminíferos, rochas ígneas, poeira mineral, conchas, corais, carbonatos, esmalte dentário, água e lã.  
Mais informações em Tipos e seleção de amostras para a análise de estrôncio.

Arqueologia

Strontium ratio human deciduous teeth

A razão isotópica de estrôncio (87Sr/86Sr) de dentes decíduos humanos revela a mobilidade humana no sul da Itália durante os períodos gravetiano e epigravetiano (anos calendáricos antes do presente 32157-19097), através do último máximo glacial. Adaptado de Lugli et al., 2019.

Cada região do mundo apresenta uma razão de 87Sr/86Sr específica baseada nas fontes de água e geologia circundantes. A geologia e, consequentemente, os solos, têm uma assinatura de 87Sr/86Sr sespecífica ligada à sua origem. Dessa forma, plantas, humanos e outros animais herdam as assinaturas de Sr de seus habitats, pois o Sr é incorporado a suas células, junto com outros elementos (por exemplo, Ca).

Na medida em que os humanos e os animais se movem de um habitat para outro, podem ser expostos a diferentes fontes de água e de comida (vegetal ou animal). A medição da razão de 87Sr/86Sr em ossos e pelos humanos e animais é uma ferramenta eficaz para rastrear mobilidade e migração. Por exemplo, a análise de 87Sr/86Sr em dentes humanos pode proporcionar informações sobre o local de nascimento, já que nascemos tanto com os dentes permanentes quanto com os temporários. Além disso, medir 87Sr/86Sr de cabelos e unhas, que são constantemente repostos, pode produzir evidências de locais ocupados mais tardiamente na vida e anteriores à morte.

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O uso de análises isotópicas em ossos: datação, análises ambientais e migração

O rastreamento da dieta de herbívoros e onívoros pela análise isotópica

Água subterrânea

Strontium ratio of groundwater

A intrusão de água salgada no Aquífero de Biscayne indicada pela razão isotópica de estrôncio (87Sr/86Sr) de amostras de água coletadas no condado de Miami-Dade em 2009. Dados de Prinos et al., 2014.

Processos físicos como o intemperismo não causam fracionamento em isótopos de estrôncio. Como a razão de 87Sr/86Sr não é impactada pelo intemperismo, ela retém a assinatura das formações rochosas circundantes e, por isso, as rochas meteorizadas também podem ser analisadas.  

Além disso, a razão de 87Sr/86Sr em água subterrânea reflete a assinatura isotópica da água da fonte mais as formações rochosas ao longo de seu caminho de fluxo. O uso da razão isotópica de Sr em conjunto com a concentração de Sr da água é um excelente método para rastrear a mistura e contaminação de águas subterrâneas, assim como a intrusão de água salina.

Por exemplo, os valores isotópicos e a concentração de estrôncio podem ser usados para mapear a fonte e os níveis de contaminação em perfis de água subterrânea, como demonstrado por Nigro et al. (2017).

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Geocronologia – Estratigrafia

Sr Isotope Seawater Curve

Razão isotópica de estrôncio (87 Sr/ 86 Sr) de água marinha durante o tempo geológico baseado em análises de amostras de sedimento, braquiópodes inalterados, belemnites, conodontes e foraminíferos de várias localidades ao redor do mundo. A área vermelha denota o intervalo de 95% de confiança. Adaptado de McArthur et al., 2001.

A precipitação de carbonatos biogênicos marinhos e fosfatos envolve a absorção de estrôncio da água marinha com a razão de 87Sr/86Sr idêntica àquela do valor oceânico no momento da incorporação. Os níveis de 87Sr/86Sr do oceano variam ao longo do tempo, o que cria uma curva marinha previsível para a calibração da datação. Essa curva de Sr em água marinha desenvolveu-se pelos últimos 850 milhões de anos com calcita de foraminíferos, rostra de belemnites, aragonita de amonitas e cimento marinho (McArthur et al. 2012).

A idade da amostra (minerais marinhos) pode ser determinada ao medir a razão de 87Sr/86Sr e inseri-la na curva padrão de estrôncio marinho. Esse método funciona melhor para períodos de tempo com mudanças unidirecionais de longo prazo na razão de 87Sr/86Sr, como o período Terciário, mas tecnicamente pode funcionar para os últimos 600 milhões de anos. O método oferece uma resolução máxima de tempo de 1 milhão de anos.

Aplicações forenses

Geochemical fingerprinting food

Faixas de 87Sr/86Sr de substratos geológicos (caixas abertas) e vinhos (caixas cheias) de vinhedos do mesmo substrato em diferentes regiões da Itália. Redesenhado de Marchionni et al., 2013.

O conceito de “somos aquilo que comemos” é verdadeiro quando consideramos a assinatura isotópica dos seres vivos. As células de plantas, humanos e outros animais refletem a assinatura isotópica da comida e da água de seus habitats, inclusive a assinatura de estrôncio de 87Sr/86Sr. Essa qualidade tem sido usada de forma exitosa em ciências forenses para o rastreamento geoquímico de narcóticos, para estudar o histórico étnico de um indivíduo vivendo em determinada sociedade, para mapear o padrão migratório de comunidades, para apontar o local de morte, e para detectar adulterações de alimentos, especialmente da indústria vinícola. Essa técnica é similar à usada por pesquisadores arqueológicos para identificar a migração de povos, comércio de bens e características de estilo de vida de antigas civilizações.  

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Análises isotópicas em geografia forense

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Indústria petrolífera

As razões isotópicas do estrôncio em sais residuais da camada de petróleo da formação jurássica inferior de Tilje, na Noruega, mostra que camadas de folhelos compartimentalizam os reservatórios de petróleo. Algumas camadas são barreiras mais efetivas que outras à mistura de petróleo. Modificado de Peters et al., 2005.

O mapeamento geoquímico de Sr tem uma variedade de aplicações da indústria petrolífera. Como diferentes formações geológicas apresentam assinaturas isotópicas específicas de Sr, a razão de 87Sr/86Sr pode ser usada para estudar a migração e a mistura do petróleo entre unidades geológicas, e também sua eficiência de compartimentalização. Além disso, a razão isotópica de Sr é amplamente empregada no rastreamento de água produzida e na estratigrafia isotópica.


Referências

Bentley, R.A., (2006). Strontium isotopes from the earth to the archaeological skeleton: a review. Journal of archaeological method and theory, 13(3), pp.135-187. DOI: 10.1007/s10816-006-9009-x

Capo, R.C., Stewart, B.W. and Chadwick, O.A., (1998). Strontium isotopes as tracers of ecosystem processes: theory and methods. Geoderma, 82(1-3), pp.197-225. DOI: 10.1016/S0016-7061(97)00102-X

Lugli, F., Cipriani, A., Capecchi, G., Ricci, S., Boschin, F., Boscato, P., Iacumin, P., Badino, F., Mannino, M.A., Talamo, S. and Richards, M.P., (2019). Strontium and stable isotope evidence of human mobility strategies across the Last Glacial Maximum in southern Italy. Nature ecology & evolution, 3(6), pp.905-911. DOI: 10.1038/s41559-019-0900-8

Marchionni, S., Braschi, E., Tommasini, S., Bollati, A., Cifelli, F., Mulinacci, N., Mattei, M. and Conticelli, S., (2013). High-precision 87Sr/86Sr analyses in wines and their use as a geological fingerprint for tracing geographic provenance. Journal of agricultural and food chemistry, 61(28), pp.6822-6831. DOI: 10.1021/jf4012592

McArthur, J.M., Howarth, R.J. and Bailey, T.R., (2001). Strontium isotope stratigraphy: LOWESS version 3: best fit to the marine Sr-isotope curve for 0–509 Ma and accompanying look-up table for deriving numerical age. The Journal of Geology, 109(2), pp.155-170. DOI: 10.1086/319243

McArthur, J.M., Howarth, R.J. and Shields, G.A., 2012. Strontium isotope stratigraphy. The geologic time scale, 1, pp.127-144.

Nigro, A., Sappa, G. and Barbieri, M., (2017). Strontium isotope as tracers of groundwater contamination. Procedia Earth and Planetary Science, 17, pp.352-355. DOI: 10.1016/j.proeps.2016.12.089

Peters, K.E., Walters, C.C. and Moldowan, J.M., (2007). The biomarker guide: Volume 1, Biomarkers and isotopes in the environment and human history. Cambridge university press.

Prinos, S.T., Wacker, M.A., Cunningham, K.J. and Fitterman, D.V., (2014). Origins and delineation of saltwater intrusion in the Biscayne aquifer and changes in the distribution of saltwater in Miami-Dade County, Florida (No. 2014-5025). US Geological Survey. DOI: 10.3133/sir20145025